Estudo sobre as origens da lenda e um resumo do romance “Sir Gawain e o Cavaleiro Verde”

O universo de mitos e lendas que cercam o Rei Arthur, e também seus personagens secundários, é um dos meus preferidos. É uma imensa coleção de folclore, com fontes — como todo bom folclore — por vezes, divergentes, que com o passar dos séculos, tornam-se cada vez mais amplas e coloridas. Minha intenção aqui não é analisar os aspectos psicológicos de cada lenda, seu diverso simbolismo, ou mesmo conectá-las com os seriados e filmes em nossos aparelhos de televisão. É apenas mostrar as origens de uma cultura que trespassa milênios, explorando um personagem de cada vez.
Neste post, vou falar sobre Sir Gawain, e também resumir o famoso texto do século XV, “Sir Gawain e o Cavaleiro Verde”.
Nota: A minha principal fonte acadêmica foi “The New Arthurian Encyclopedia (Garland, 1996)”. Se outras, as mencionei no texto. As traduções de nomes no antigo galês são minhas e não oficiais.
Gawain, assim como Bedivere e Kay, é associado às raízes das lendas Arturianas na tradição céltica. Ele é sobrinho do Rei Arthur, filho de sua irmã (Anna ou Morgause) com o rei Lot, de Lothian e Orkney (regiões escocesas), e um bravo e fiel cavaleiro. No ambiente celta, o filho da irmã é geralmente bem visto, além de ser um dos herdeiros do reino. Ainda que sua existência não possa ser traçada a um personagem histórico, Sharon Paice MacLeod, em seu livro “Celtic Myth and Religion”, menciona o manuscrito de William Malmesbury (ca. 1095-1143), como uma possível fonte histórica. Malmesbury descreve Walwen (Gawain) como um corajoso e muito bem conhecido guerreiro, que ajudou a defender terras celtas e reinou parte da Bretanha. Ele também diz que seu túmulo fora encontrado durante o reinado de William I, mas que o local do sepultamento do Rei Arthur, ainda era desconhecido.
O nome de Gawain aparece na muito mencionada obra Historia Regum Britanniae, de Geoffrey de Monmouth (séc. XII), e também na lenda Culhwch ac Olwen (Como Culhwch ganhou Olwen: um importante texto galês, que, apesar de seu manuscrito mais velho datar de ca. 1325, sua linguagem pode ser atribuída a pouco antes do século XI), e também nas Welsh Triads (Tríades Galesas: textos do século XII, cujas origens orais provavelmente datam de muito antes). Diz-se que a força de Gawain aumenta e diminui junto do sol, o que pode ser referido a uma divindade celta solar. Nestas fontes mais primitivas, Gawain é visto como um valente cavaleiro que ajuda Arthur em suas diversas campanhas. Sempre justo e cortês, mais tarde Gawain assume a fama de galanteador. Como será mostrado em “Sir Gawain e o Cavaleiro Verde”, as mulheres o perseguem em investidas ousadas. Na obra de Chrétien de Troyes, apesar de assumir um papel maior do que em obras anteriores, Gawain transforma-se em um tipo de coadjuvante para o herói. Em “O cavaleiro da carreta”, ainda que com intenções nobres de resgatar Guinevere, Gawain sempre toma decisões erradas, ao contrário de Lancelot, que consegue alcançar o castelo de Maligeant, passar por diversos testes e salvar a rainha. Esta figura de “amigo do herói”, aparece também em “Tristrant” de Eilhart von Oberg (ca.1170 – 1190), uma das fontes mais primitivas de Tristão e Isolda. Gawain torna-se amigo de Tristão quando este é banido da corte do rei Marcos (Schoepperle, Tristan and Isolt, A Study of the Sources of the Romance (Franklin, 1913)), e o ajuda a arranjar um encontro com a rainha Isolda. Já em “Prose Tristan”, um manuscrito narrando as aventuras de Tristão pós-ciclo Vulgate (ca. 1230), Gawain é retratado como “um vilão assassino, sem respeito por pessoas ou propriedade” (citação: The New Arthurian Encyclopedia).
Apesar de divergentes papéis, a imagem preservada de Gawain é geralmente favorável. Seu relacionamento com seus irmãos (Agravain, Mordred, Gareth, Gaheris), assume grandes proporções no ciclo Vulgate, que é mantido por Sir Thomas Malory na obra finalizada em 1470, “A morte de Arthur”. Neste contexto, ele está sempre ao lado de Arthur como cavaleiro e conselheiro. Ele tenta dissuadir Mordred quando este quer desmascarar o caso amoroso entre Guinevere e Lancelot, mas sua relação com Lancelot torna-se de vingança, quando o cavaleiro acidentalmente tira a vida de seu irmão, Gareth. Gawain pede que Arthur mande suas tropas contra Lancelot, o que deixa o reino de seu tio nas mãos de Mordred. Mesmo depois de duas batalhas contra Lancelot, Gawain se recusa a perdoá-lo, mas se arrepende em seu leito de morte.
Um outro trabalho inglês do século XV, que divide algumas similaridades com “Sir Gawain e o Cavaleiro Verde”, e vale mencionar, é “Syre Gawene and the Carle of Carlyle” (Sir Gawain e o Carl de Carlyle), onde Sir Gawain, Sir Kay e o Bispo Baldwin se perdem durante uma caçada, e tem que pedir abrigo no castelo do Carl de Carlyle. O Bispo avisa que o Carl tem costume de matar aqueles que passam a noite em seu castelo, porém Sir Kay bate no portão, dizendo que vai ensinar uma lição ao Carl. Ele imediatamente muda de ideia ao ver seus animais de estimação (um touro, um javali, um leão, e um urso). O Carl, quase um gigante, os recebe com vinho e bom humor, mas quando Sir Kay dá um tapa no cavalo do anfitrião, este lhe dá um tapa em troca. O senhor do castelo dá ordens estranhas durante o jantar, como pedir que o acertem com uma lança, ao que apenas Gawain obedece. À noite, ele sugere que Gawain durma com sua esposa. Gawain aceita, mas o Carl muda de idéia, então cede sua bela filha, ao invés da esposa. No dia seguinte, enquanto mostra os ossos de outros cavaleiros que foram assassinados por ele, o homem diz a Gawain que ele foi o único a passar no teste, e tudo que se tinha a fazer era cumprir suas ordens.
Sir Gawain e o Cavaleiro Verde
O manuscrito preservado em Middle English data de cerca de 1400, e é um dos mais belos romances de literatura Arturiana. É escrito em stanzas de comprimento irregular, cada uma terminada em rimas de bob-e-roda. Um conto de fadas para adultos, de seu autor nada é conhecido além do poema em si, e devido a linguagem, atribui-se a ele/a, os manuscritos de Pearl, Cleanness, e Patience, mas o caso está longe de ser provado.
Para apresentar o resumo da obra, usei como fontes “The New Arthurian Encyclopedia (Garland, 1996)”, e as traduções do romance original “Sir Gawain and the Green Knight” por J.R.R. Tolkien (Ballantine Books, 1980), e também de Kenneth G.T. Webster e W.A. Nielson (Global Gray Books, 2018). As traduções em português de algumas stanzas foram feitas livremente por mim. A intenção de reproduzir o lirismo original foi preservada.
O poema começa com as comemorações de final de ano na corte de Arthur. Fala sobre seus ilustres convidados da Távola Redonda, de como fora um belo banquete o de Natal, com a missa celebrada, e começa a descrever o banquete de Ano Novo que está acontecendo naquele momento. Arthur, como era seu costume, não comeria até ver uma “maravilha.” O poeta nos fornece ricos detalhes sobre quem eram os convidados, dizendo que Gawain sentava-se ao lado de Guinevere, com Agravain do outro lado, e os descreve como ambos filhos da irmã do rei, e leais cavaleiros. Ele também fala que o Bispo Baldwin teve a honra de cortar o porco, e Ivan, filho de Urien, comia ao lado dele. Em meio a celebração, entra no hall, montado em seu cavalo, um desconhecido cavaleiro, de verde brilhante dos pés à cabeça:
“De completo verde eram eles tintos, ambos traje e homem:
um casaco justo e estreito rente aos flancos;
um rico manto acima do conjunto por ele vestido
com pelame bem aparado, ostentando luxuosa fímbria
de um maravilhoso arminho, assim como seu capuz era
que alteado de sua cabeça, por seus ombros caía;”
O poeta continua a descrever suas vestes em detalhe, fala de seus cabelos verdes, da grande barba que descia por seu peito, do verde cintilante que era também seu cavalo, atentando-se para o ramo de azevinho que traz em sua mão, e um enorme machado verde na outra. O cavaleiro então troca algumas saudações com Rei Arthur, que por sua postura agressiva, já lhe avisa que ele não quer guerrear. O Cavaleiro Verde responde que não é guerra que ele procura, por isso o ramo de azevinho em sua mão, mas desafia os guerreiros presentes a lhe dar um único golpe com seu machado, que ele poderá revidar em exatamente um ano. Primeiramente ninguém se habilita, mas visto a provocação do cavaleiro, que pergunta se aquela é mesmo a corte de Rei Arthur, com tão renomados cavaleiros, Arthur toma o desafio para si. Gawain o impede, e diz que honrará o pedido. O Cavaleiro Verde então se faz pronto, inclina-se, tirando os cabelos do ombro, e mostra seu pescoço verde e nu. O autor nos dá uma bela cena de decapitação:
“Gawain apanhou o machado, o recolheu e o ergueu,
do alto, com rapidez o aterrissou onde estava desnudado
que de tão afiada a lâmina os ossos lhe estremeceu,
e afundou-a limpa através da carne que partiu separada,
e a lâmina de aço brilhante trincou o chão.
A bela cabeça, por terra dos ombros caiu,
e o povo a defendeu de seus pés quando rolando seguiu;
o sangue rompeu do torso, luminoso em seu verde,
e contudo, nem fraquejou ou falhou o homem feroz,”
Depois de perder a cabeça, o Cavaleiro Verde, para espanto de todos, não está nada morto. Ele apanha sua cabeça com a mão, e relembra Gawain de sua promessa, que ele poderia revidar o golpe em um ano. Ele instrui o cavaleiro a procurá-lo na Capela Verde, onde o aguardaria. O homem se vai, deixando o machado verde, e Arthur, decide pendurá-lo na parede como uma lembrança de tal maravilha.
No segundo canto, o autor nos mostra a passagem do ano. Gawain não se preocupa com a promessa até o final de outubro.
“Pois homens, felizes em seus humores seguem, quando muitos brindes erguem,
um ano passa sem demora, nunca o mesmo de outrora;”
No dia 2 de novembro, no banquete de Todos os Santos, Gawain sai para a viagem. Arthur muito lamenta, mas o cavaleiro responde sua tristeza com coragem. Ele se veste dos mais belos trajes, e uma outra detalhada descrição de suas roupagens segue. Ele faz a jornada pelo País de Gales e norte da Inglaterra, a todos que encontra, pergunta se conhecem a Capela Verde, mas sem sucesso. Em uma manhã ele entra em uma floresta:
“de enormes carvalhos envelhecidos, pelas centenas agregados;
a aveleira e o espinheiro amontoados e embaraçados
com grosseiros farrapos de musgo em volta deles rastreado
com muitas aves desoladas nos galhos nus acomodados
que piedosamente piavam pelo desgosto da friagem”
Ali, ele descobre um maravilhoso castelo, com torres brancas, cujo senhor o recebe em grande esplendor. O homem conhece sua reputação, e considera uma honra receber tal cavaleiro. Já é Natal, Gawain celebra junto de seu anfitrião com muita música, boa comida e bebida. Durante o jantar, ele conhece a esposa do homem, uma bela donzela, e o autor diz que, para Gawain, ela era mais bela que Guinevere, a rainha do Rei Arthur. Junto da mulher, está uma velha, muito feia, toda vestida de preto, que a acompanha em todos os lugares. A esposa do homem faz muito gosto de sua companhia.
No dia seguinte eles também festejaram, e após as comemorações, Gawain pergunta ao seu anfitrião sobre a Capela Verde. Este lhe diz que é bem perto dali, e logo sugere que Gawain fique no castelo até o dia de seu compromisso. Gawain aceita de bom grado. O anfitrião também diz que na manhã seguinte, sairá para caçar, e pede a Gawain que fique no castelo. Ele precisa poupar suas forças para o encontro com o Cavaleiro Verde, e enquanto o outro está fora, Gawain pode dispor da companhia de sua bela esposa e também da velha. No final da conversa, o senhor faz uma proposta: tudo que ele ganhar no dia de caça, presenteará a Gawain, e tudo que Gawain ganhar em seu dia no castelo, presenteará ao seu anfitrião. O autor termina este canto com uma dica para os leitores:
“Com devotos criados e reluzentes candelabros
foram levados afinal até seus leitos tão aconchegados,
cada um deles.
Mas pouco na cama chegaram,
ele da barganha se recordara;
ele sabia como jogar um jogo
o velho governador daquela morada.”
O terceiro canto começa com o início do dia seguinte, e o senhor aprontando-se para a caçada. Uma longa descrição dos preparativos segue, e logo o grupo entra na floresta e encontra um cervo. Os cachorros conseguem cercar o animal, e com muitos latidos e fanfarras, o capturam. No castelo, Gawain dorme, quando ouve o ruído da porta se abrindo, e alguém entrando em seus aposentos:
“um canto da cortina ele por pouco afastou,
e desconfiado, olhou naquela direção para saber do que se tratava.
Era a senhora, mais bela de se ver,
que com precaução fechava a porta atrás de si,
e de sua cama se aproximava. Então por rubor o cavaleiro foi tomado,
e deitou-se de pronto, para aparentar pelo sono embalado;”
A dama deita-se ao lado de Gawain, e ali, eles ficam um longo tempo; ela esperando que ele acordasse, e ele fingindo dormir. Até que ele “desperta” e eles trocam comprimentos com muita simpatia um pelo outro. Ela abertamente tem a intenção de seduzi-lo, dizendo:
“Ao meu corpo bem acolhido serás,
de prazer para tomar seu quinhão
pois a necessidade me obriga,
a servir-te, e assim farei.”
Ela é recebida pelos protestos educados de Gawain, pois ele não pode deitar-se com a esposa de seu anfitrião. Ela insiste, e depois de extensa troca, ele concorda em lhe dar um beijo. A próxima stanza segue com a detalhada descrição do corte do cervo pelos caçadores. Quando o senhor do castelo chega com a carne do animal, ele o presenteia a Gawain, como eles haviam combinado. Gawain o presenteia com o beijo que ele recebeu da esposa do homem. O homem fica surpreso com a prenda, e lhe pergunta onde ele ganhou tal oferta. Gawain responde para que não lhe pergunte, pois não foi o combinado. O homem ri e concorda.
O dia seguinte passa da mesma maneira, desta vez o senhor captura um grande javali e o traz para o palácio. A esposa do homem entra no quarto do cavaleiro, e insiste para que ele a tome em seus braços, relembrando sua fama de galanteador. Gawain novamente recusa, mas lhe dá um beijo. Quando chega o momento de trocar os presentes, Gawain ganha o javali, e o anfitrião ganha mais um beijo. O homem, bem humorado, diz:
“Por São Egídio,
alcançar-te nunca irei conseguir!
terás riquezas em pouco tempo
se tal troca perseguir.”
Naquela noite, a esposa lança longos olhares para Gawain durante a ceia, que não são retribuídos. A velha está sempre ao lado dela, e apesar de não ter falas no poema, ela passa a ser bem quista por Gawain, pois lhe faz boa companhia. Após o jantar, o cavaleiro quer se despedir. Ele seguiria viagem para a Capela Verde na manhã seguinte, mas o anfitrião lhe assegurou que era bem perto, e que no dia de seu compromisso, um de seus servos o acompanharia até a capela.
Na manhã da véspera de Ano Novo, o anfitrião sai para mais uma caçada, onde encontra uma raposa, e com grande dificuldade a captura. O cavaleiro mais uma vez recebe a visita da mulher em seu quarto. Naquele dia, ela se aproxima dele ricamente vestida, deita-se em sua cama, e mais ousada, dá um beijo em Gawain sem pedir permissão, quando este abre os olhos. Ela então tenta seduzir o cavaleiro mais uma vez, ele cuidadosamente a recusa, mas ela pede por mais um beijo, o que ele concede. Sabendo que ele logo iria embora, a senhora quer um presente para lembrar-se dele, mas Gawain se nega. Ele diz que por estar viajando, não tem nada digno de tão rica senhora. Apesar da negativa, ela lhe oferece uma prenda, um anel de pedras preciosas, o qual ele dispensa, argumentando que não tem nada para lhe dar em troca. A dama lhe oferece a cinta de seu vestido, feita de seda verde e bordados de ouro. Gawain mais uma vez diz não, mas ela explica um detalhe sobre a cinta que interessa o cavaleiro:
“‘Tu recusas agora esta seda’, disse a bela dama,
‘por ser ela pobre? E assim aparenta.
Vejas como é pequena, estreita no tamanho, e menor ainda em valor!
Mas quem sabe da natureza desta trama
a estima ainda mais preciosa
Pois aquele que vai orlado desta cinta verde,
enquanto amarrada bem perto dele,
não existe um outro tão habilidoso abaixo dos Céus capaz
de lhe cortar;
pois não poderia ser morto por nenhuma mão sagaz.’”
Quando soube dos poderes mágicos da cinta, Gawain a aceita, agradecendo com mais um beijo. Naquele dia, eles trocam longos abraços. A dama o deixa, ele se veste e sai à procura de um padre. Confessa seus pecados, e prepara-se para o fatídico encontro no dia seguinte.
Quando o senhor chega da caça, Gawain se adianta, e dá nele três beijos “tão longos e deliciosos quanto conseguiu”. O outro lhe presenteia com a raposa, dizendo que tal presente não era nada comparado aos três beijos que recebera de Gawain.
Na mesma noite, o cavaleiro agradece o anfitrião pela estada, muito grato por tamanha boas-vindas no castelo. Também se despede da dama e da velha que a acompanhava, e dos empregados que desde o Natal o serviam.
Durante a madrugada Gawain não consegue dormir, e o autor nos dá uma imagem de seu desassossego:
“A neve atroava afiada, a ressequir a vida selvagem,
o vento rodopiante estremecia as alturas
e cada vale de correntezas aprofundava.
Por longo tempo o cavaleiro ouvia, deitado em sua cama;
apesar de fechar as pálpebras, muito pouco ele dormia;
no canto de cada galo, lembrava-se muito bem de seu encontro.”
Gawain se apronta bem cedo, e sem demora, sai junto de um servo, que vai lhe mostrar o caminho. O homem lhe avisa que o Cavaleiro Verde é cruel, e pede para que ele fuja, pois não terá a piedade do adversário. Gawain agradece a preocupação do homem, mas diz que vai até o fim com sua promessa. O homem o deixa em um ponto da estrada, por que se recusa a ir mais longe. Ele segue sozinho até um morro, e descobre que a Capela Verde é na verdade uma caverna.
O Cavaleiro Verde aparece, primeiramente fazendo um grande barulho contra as pedras. Eles trocam algumas palavras, o adversário parece muito mais animado do que Gawain para o encontro, mas o cavaleiro se prepara para receber o golpe, mostrando seu pescoço nu. O outro ergue o machado, mas Gawain hesita, estremecendo de leve os ombros. O Cavaleiro Verde lhe repreende longamente, ao que Gawain responde:
“‘Eu recuei uma vez’, disse Gawain
‘e não mais o farei.
Mas se no chão cair minha cabeça,
não mais a recuperarei.’
‘Mas ocupa-te, eu imploro, senhor, e vais direto ao ponto.
Trate-me de meu destino, e o faça sem reconsiderar!
Pois eu devo receber de ti um golpe, e não mais vou hesitar
até seu machado a mim cortar,’”
O Cavaleiro Verde prossegue, e dessa vez realmente Gawain não estremece como antes, mas o homem pausa mesmo assim, observando que ele cumpriu sua palavra, e não hesitou. Gawain novamente pede para ele deixar de conversa, e dar o golpe. O homem ergue pela terceira vez a arma, e atinge Gawain no pescoço, mas apenas corta a pele, o suficiente para sangrar, mas não com a intenção de machucá-lo. Vendo seu sangue no chão, Gawain imediatamente se levanta, e tendo cumprido o trato, pega sua espada e escudo para defender-se. Mas o homem diz que não quer lhe fazer nenhum mal. Na verdade, ele é o senhor do castelo, que tão bem lhe recebeu todos esses dias. Cada golpe fora em relação aos presentes que eles trocaram no decorrer de sua estada, nos primeiros dois, o machado não lhe tocou pois ele fora verdadeiro, e deu ao senhor aquilo que recebeu. Mas no terceiro dia ele não lhe deu a cinta verde, e por isso o corte em seu pescoço. Ainda assim, o homem compreendia que Gawain tinha intenção de poupar a própria vida, por isso sua honra estava intacta. O homem sabia que sua esposa havia tentado por três dias seduzir o cavaleiro, ele mesmo combinara o teste com ela, e Gawain havia, diversas vezes, provado seu valor e honra. Mas o desafio, desde a visita na corte de Arthur, fora apenas uma brincadeira da feiticeira Morgan le Fay. Aquela disfarçada de velha no castelo, ela era na realidade, a tia de Gawain, e queria só dar um susto na Rainha Guinevere com a decapitação do Cavaleiro Verde.
“Ela me fez ir assim disfarçado em sua boa corte
para colocá-los à prova, se verdadeira era a glória
que corre sobre a notória Távola Redonda.
Ela colocou em mim esta feitiçaria, para de seu juízo privar
na esperança de Guinevere machucar, que ela de horror sucumbiria
chocada com aquele fascinante e aterrorizante narrador
que com sua cabeça na mão, falava diante da companhia”
Ao saber da verdade, Gawain se enfurece, em um misto de vergonha e raiva. Mesmo com os pedidos do Cavaleiro Verde para que ele voltasse ao castelo, e esquecesse de todo o episódio, Gawain se recusa. Ele, porém, quer ficar com a cinta verde, pois quando for enaltecido como cavaleiro, vai lembrar-se com lástima do truque do qual fora vítima. Por fim, ele pede apenas que o homem revele seu nome, e o outro responde ser: Bertilak de Hautdesert.
De volta à corte de Arthur, Gawain é muito bem recebido pelo rei e por sua rainha. Ao recontar sua aventura, ele diz, com as bochechas rubras, apenas a verdade. Todos compreendem sua aflição, e em solidariedade, damas e cavaleiros da corte, também passam a usar junto de si, uma cinta verde.
Se quiser conhecer a história completa de “Sir Gawain e o Cavaleiro Verde”, deixo aqui o link desta versão em português, uma produção independente, disponível na Amazon Kindle. As rimas foram um pouco perdidas nesta tradução em particular, e eu não a conheço a fundo para validá-la totalmente, mas tem uma boa introdução sobre a história do Cavaleiro Verde, além de ser o poema na íntegra.